NEOJIBA - FASCINANTE EXPERIENCIA!
NEOJIBA e Ricardo Castro no Jornal A Tarde

JC TEIXEIRA GOMES

O nome, Neojibá , pode parecer complicado, mas abriga uma fascinante experiência musical: trata-se da sigla dos Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia, fundados em Salvador pelo pianista e maestro Ricardo Castro em 2007, sob inspiração de iniciativa venezuelana congênere, integrando a Fundación del Estado para el Sistema Nacional de Orquestas Juveniles y Infantiles de Venezuela.

Estive recentemente em Salvador e ouvi muitas queixas sobre a situação cultural da Bahia, com sucessivas denúncias contra aquilo que os descontentes qualificavam de “grave omissão” do governo do Estado e da prefeitura. Li também uma ampla matéria em A TARDE, com um rosário de lamentações de dirigentes de órgãos culturais, criticando a morosidade na liberação de verbas de manutenção. Instituições respeitáveis, unânimes nas queixas.

Tudo pintava um quadro desastroso, de triunfo da burocracia sobre a vida cultural da cidade e do Estado.

Estou há anos fora da Bahia e nada disto me surpreendeu, pois tem sido uma nociva tradição, não só em nossa terra como em todo o Brasil, os governos tratarem a cultura com má vontade.

Em regra, só dão apoio às iniciativas de praça pública, que lhes podem render votos. Não foi por outro motivo que me enchi de esperanças quando o governo Wagner convidou Márcio Meirelles para a Secretaria da Cultura. Tratavase de homem de teatro, com sólido conceito em sua área de atuação.

Distanciado da Bahia, não me aventuro a uma análise mais detida do que está ocorrendo hoje. Mas é óbvio que a vida cultural de um povo, sobretudo na diversidade das suas manifestações, não pode ficar na dependência dos humores oficiais ou dos impulsos do cipoal burocrático. É preciso criar. E três anos já deveriam ter sido mais do que suficientes, ao menos para a regulamentação do fluxo de recursos dos quais as instituições precisam para funcionar.

Há algo de danoso e errado nesse processo de protelações.

Se a crise existe, quero, porém, dar um depoimento sobre notável realização que presenciei há pouco na Bahia, e prestigiada pelo governo: o já citado Neojibá . A fundação dessa orquestra de jovens (entre os 10 e os 25 anos), denominada “2 de Julho”, é um fato inédito no Brasil, e nós a ficamos devendo à clarividência do pianista e maestro Ricardo Castro, convidado pelo governo do Estado para assumir a direção artística da Sinfônica da Bahia.

Ricardo Castro não é apenas o pianista baiano que todos os aficionados da música clássica já conhecem de sobra, sobretudo pela sua incomparável musicalidade, dom raro, mesmo entre os mais virtuosísticos dos intérpretes.

Quem já o viu reger também testemunhou a sua competência no pódio: liderança, aguda percepção dos naipes, visão do conjunto orquestral, identificação autoral. Mas por ser, acima de tudo, um homem da música, está doando à Bahia o prêmio supremo de uma orquestra de jovens.

Fui ver um dos ensaios. Saí arrebatado.

Aqueles meninos e meninas sufocaramme a garganta, tendo a audácia de interpretar magnificamente Wagner e uma difícil suíte de Bizet! Ricardo Castro interrompia a execução, aperfeiçoava a sonoridade, expunha a intenção do compositor, esclarecia passagens difíceis, com absoluta dedicação. Era o incentivador dos garotos e o maestro que olha o futuro musical da Bahia. Fechei os olhos para conferir a excelência das cordas. Fui às nuvens. Pareciam profissionais.

Nota dez para aquela juventude talentosa e dourada.

A orquestra Neojibá era uma reafirmação da vocação musical do baianos.

Entusiasmado, entrevistei alguns dos jovens instrumentistas, sobretudo os violinos. Eis a exata pergunta que lhes fiz: “Como é que vocês, com os ouvidos massacrados dia a noite pela percussão da axé, conseguem tocar tão bem um instrumento tão suave e tão difícil?”.

E a resposta, unânime: “Nós gostamos é de música! Aqui nos sentimos à vontade”. E já vão exibir-se fora do Estado.

É isto a Bahia. É este o caminho da sua diversidade cultural, tão negada nos últimos tempos. Mas a Bahia não é só trio elétrico. Honra, pois, a Ricardo Castro e a quem o apoia, pelo maravilhoso trabalho que vêm realizando, talvez ainda sem a projeção pública local que exprima a relevância dos seus méritos.

JC TEIXEIRA GOMES 
Jornalista, membro da Academia de Letras da Bahia. 
E-mail: jcteixeiragomes@hotmail.com

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